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sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Setor Elétrico ==== Valor Econômico 20/10/2010

Nos últimos oito anos, o consumo de energia elétrica no Brasil cresceu 32% passando de 293 mil GWh em 2002 para cerca de 390 milGWh em2009. Ociclo de alta das commodities, o crescimento da economia e da renda dos brasileiros, que estão comprando mais eletrodomésticos, e o programa Luz para Todos, que incorporou 10 milhões de pessoas à rede básica, fizeram residências, indústrias e comércio consumirem mais energia. A expansão não irá parar por aí: com a continuidade do crescimento, a realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 e a expansão de China e Índia, dois grandes consumidores de produtos básicos, o mercado de energia elétrica deverá continuar sua trajetória de alta.
Com um crescimento anual de 5,1% da economia brasileira na década, previsões da Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE), órgão estatal de planejamento do setor, apontam que o consumo de energia elétrica deve aumentar 5% ao ano entre 2010 e 2019, com destaque para o segmento comercial, cujo consumo deve crescer 6,2% ao ano. Na indústria, o aumento será de 5,1% e, nas residências, de 4,6%. Mesmo assim, o brasileiro ainda consome pouca energia frente a outros países: o consumo per capita está em 2.300 KWh por ano, um quinto do registrado nas economias desenvolvidas.
Para atender à alta de demanda, o desafio é grande. Serão necessários R$ 175 bilhões em projetos de geração para acrescentar 6.300 MW de capacidade nova por ano ao sistema nacional até 2019. Em paralelo, deverão ser investidos R$ 39 bilhões na construção de 37 mil quilômetros de linhas de transmissão para escoar a energia produzida. “A prioridade é que a expansão do sistema seja feita com hidrelétricas e fontes renováveis, como usinas eólicas e de biomassa”, diz o presidente da EPE, Mauricio Tolmasquim. “Com as obras contratadas nos últimos anos, temos um excedente de 5.800 MW médios até 2014”, afirma.
Com uma capacidade instalada de cerca de 105 mil MW, o setor elétrico deverá crescer ao longo da década cerca de 60% e chegar a 2019 com 167 mil MW, sendo que boa parte desse acréscimo virá de projetos hidrelétricos. Apenas as usinas hidrelétricas de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau, juntas, serão responsáveis por cerca de 10% da capacidade do sistema interligado em 2019. Ao se incluir os empreendimentos dos rios Teles Pires, Tapajós e Jamanxim, que poderão ser licitados nos próximos anos, a participação das grandes usinas da região Norte fica em torno de 15% do total do setor elétrico nacional.
O desafio de construção dos grandes empreendimentos e de conciliar crescimento com preservação ambiental se alia a outro: o financiamento. “É fundamental que haja financiamento de longo prazo no Brasil para os projetos de infraestrutura, para complementar o apoio dado pelo BNDES”, diz o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy. O setor, ao lado do governo e bancos, tem buscado formas para criar de títulos de longo prazo ligados a projetos de infraestrutura para criar um mercado secundário que possibilite a maior alavancagem.
Do lado do governo, poderia ser criada uma vantagem tributária para o investidor de longo prazo que aplicasse nesses títulos. Do lado dos bancos, poderiam ser criados fundos que reunissem títulos de projetos de infraestrutura destinados a investidores interessados em aplicar dinheiro no segmento. O interessado aplicaria seus recursos em um fundo com papéis de projetos específicos de energia elétrica ou de outros segmentos. “Tirando a China, o Brasil deve ser o país a receber mais investimentos no setor de energia nesta década. O financiamento também precisa acompanhar essa realidade”, diz Godoy.
Além das hidrelétricas, o planejamento do governo tem dado atenção especial a outras fontes limpas. No fim de agosto, foi realizado um leilão com foco em fontes alternativas que resultou na contratação de 70 centrais eólicas, 12 termelétricas movidas à biomassa e sete pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que irão acrescentar cerca de 2.900 MW médios de potência instalada e receber investimentos de cerca de R$ 10 bilhões.
O destaque do leilão foi a grande participação das centrais eólicas, cujo preço médio negociado ficou em R$ 130,86 o MWh, cotação inferior aos dos projetos de biomassa e de PCHs. Para Godoy, foi criado um novo paradigma: “Primeiro, em função de a fonte eólica ter se constituído na mais barata entre as negociadas. Segundo, pelo preço competitivo da grande quantidade de energia contratada proveniente de fontes alternativas”.
Outra fonte que deverá ter destaque na matriz elétrica é a cogeração a partir da biomassa da canade-açúcar, que, em 2001, ano do racionamento, respondia por 120 MW instalados, mas hoje representa cerca de 2,5 mil MW instalados. Em 2009, a bioeletricidade gerada nos canaviais foi a fonte que mais ingressou no mercado: foram acrescentados 1.112 MW de energia de usinas de açúcar e álcool na matriz nacional.
A inserção da bioeletricidade no sistema interligado está despertando o interesse de empresas como a ETH, que, entre 2008 e 2010, já vendeu, somente em leilões, mais de 24,5 mil GWh que serão entregues durante 15 anos por suas nove unidades. A meta é atingir 2.700 GWh até 2012 nas suas unidades: São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás e Araguaia. “Os contratos de fornecimento de energia elétrica da ETH ultrapassam R$ 4,1 bilhões. O valor contempla os acordos de 15 anos de duração no período de 2010 a 2025, conquistados pela empresa nos leilões de energia de reserva realizados em 2008 e 2010”, diz José Carlos Grubisich, presidente da companhia.
Se o cenário de abastecimento não causa muita preocupação, um temor aflige grandes consumidores de energia: o preço do insumo. “A energia chega a representar 20% dos nossos custos, e os preços, que estão elevados, podem ficar ainda mais caros, o que pode prejudicar investimentos em ampliações de capacidade produtiva ou em construção de novas fábricas”, diz o superintendente da Associação Brasileira da Indústria do Vidro (Abividro), Lucien Belmonte, que frisa que, emalgumas regiões do país, o gás comercializado no Brasil chega a custar o dobro do que em outros países.
Além das fontes hídricas e alternativas, o gás natural poderá reforçar presença na matriz energética, não apenas consolidando sua participação nas termelétricas, mas também como fonte de energia para grandes consumidores como indústrias de vidros e cerâmicas. As descobertas das jazidas de présal poderão contribuir nesse sentido. Testes preliminares apontam que a proporção de gás e óleo nas jazidas do pré-sal é de 35 metros cúbicos por barril, mais rica do que na Bacia de Campos, umindicador de que as reservas são promissoras para a expansão do segmento. Estimativas apontam que a exploração do pré-sal poderia agregar mais de 60 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural, o que dobraria a oferta atual.
Segundo o governo, a oferta nacional de gás natural deverá sair de cerca de 50 milhões de metros cúbicos por dia, em 2010, para 116 milhões de metros cúbicos diários, em 2019, mais 67%. Se somados os 30 milhões de metros cúbicos diários importados da Bolívia e os 21 milhões de metros cúbicos diários de gás natural liquefeito (GNL), o país alcançará uma oferta potencial de 167 milhões de metros cúbicos por dia do insumo em 2019. O Brasil passaria a contar, em dez anos, com um excedente de gás de cerca de 15 milhões de metros cúbicos por dias — supondo as térmicas funcionando a plena carga.

Além do pré-sal, há promissores indícios vindos do Nordeste. Recentemente, a OGX, companhia de petróleo e gás do grupo EBX, do empresário Eike Batista, informou que foram identificados indícios de gás em poços localizados na bacia terrestre do Parnaíba, no Maranhão. Considerando estudos e análises, a OGX estima que os volumes potenciais podem corresponder a uma capacidade produtiva de aproximadamente 15 milhoes de metros cúbicos diários de gás natural. A empresa estima um investimento entre R$ 600 milhões e R$ 700 milhões para o projeto.

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