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segunda-feira, 29 de março de 2010

APAGÕES

Falta de investimento em manutenção afetou redes


Cortes de fornecimento ficaram mais longos a partir de novembro


  • 29 Mar 2010
  • Valor Economico
  • Chico Santos e Cláudia Schüffner
  • Do Rio


A necessidade de aumentar os investimentos na manutenção das redes de distribuição para evitar que, no próximo verão, os indicadores de piora de qualidade dos serviços desabem, como ocorreu este ano, é consenso entre representantes do Ministério de Minas e Energia, distribuidoras de energia elétrica e analistas do mercado. “É uma situação recorrente que o sistema, quando começa a operar comcapacidade muito elevada, ou acima do planejado, entra em zona de menor segurança”, resume Edmar Almeida, do grupo de economia de energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

RUY BARON/ VALOR
Kelman: Light está fortalecida do ponto de vista financeiro e operacional

Os números apresentados pelas empresas à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) corroboram a sensação de quebra da qualidade dos serviços nos últimos meses. Nos casos da Light e da Ampla, as distribuidoras que respondem pela quase totalidade do atendimento no Rio, o indicador de duração média das interrupções do fornecimento por unidade consumidora (DEC) saltou, respectivamente, de 10 horas e 12,99 horas nos 12 meses encerrados em fevereiro do ano passado para 15 horas e 21,01 horas no período de um ano fechado em janeiro de 2010.

A frequência média de interrupções (FEC) da Light no verão deste ano ficou estável 7 vezes nos 12 meses encerrados em janeiro, na comparação com o ano de 2008. Na Ampla, o indicador passou de 10,1 para 12,71 vezes. A Light foi multada pela Aneel em R$ 3,9 milhões por descumprimento de indicadores de qualidade em 2008. Em fevereiro deste ano a Aneel voltou a multar a Light, desta vez em R$ 9,5 milhões, por causa dos apagões de novembro e dezembro do ano passado. Já a Ampla vai indenizar 500 mil clientes em abril, no valor total de R$ 3 milhões, por interrupções no fornecimento.

Tanto no caso da Light como no da Ampla, o ponto de mudança da curva, especialmente da duração das interrupções, com súbita elevação, foi em novembro, quando o Sudeste sofreu um blecaute, que passou de quatro horas em alguns locais, por razões alheias às distribuidoras locais (problemas nas linhas de transmissão de Furnas).

Na apresentação feita à Aneel para justificar problemas de qualidade do serviço, a Ampla mostrou um gráfico alternativo, segundo o qual os indicadores DEC e FEC em janeiro deste ano teriam fechado em17,36 e 10,86, se não fosse a influência do blecaute de novembro.

O significado de todos esses números, para Almeida, da UFRJ, é que “as empresas estão entrando em um momento no qual precisam investir mais”. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, avalia que embora as empresas, “de um modo geral” venham demonstrando “que estão cumprindo o dever contratual de investir”, elas precisam investir mais.

Para Almeida, as distribuidoras precisam rever o direcionamento dos seus investimentos. Na sua avaliação, não são apenas fatores climáticos que estão elevando o consumo de energia elétrica, há também o crescimento do consumo geral da economia, traduzido em mais aparelhos de ar-condicionado, refrigeradores e outros eletrodomésticos no plano residencial, gerando maior consumo de energia industrial e comercial.

Com, a expectativa de crescimento econômico na casa de 5% este ano, Almeida afirma que o consumo de energia deverá ser bem maior no próximo verão, o que exige que as empresas comecem a se preparar desde já. Segundo ele, as distribuidoras investindo mais em expansão do que em manutenção e precisam agora rever essas aplicações de recursos.

Para Adriano Pires, especialista em energia e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), há também culpa da atual política do governo para o setor na redução dos investimentos e piora dos indicadores de qualidade da distribuição. Para ele, a busca da chamada “modicidade tarifária” (preços baixos), pilar do atual modelo do setor elétrico, “não dá às empresas a garantia de que os investimento realizados serão considerados na hora da revisão tarifária”.

Mesmo considerando correto que o governo zele pelos interesses do consumidor, buscando a menor tarifa possível, Pires avalia que ao querer “ganhar politicamente em cima das distribuidoras”, o governo acaba fazendo com que o consumidor pague o custo da má qualidade dos serviços.

Recém-empossado na presidência da Light, o ex-diretor-geral da Aneel Jerson Kelman chegou com um discurso de que é preciso melhorar e que a empresa está pronta a aumentar seus investimentos. “A companhia está fortalecida do ponto de vista financeiro e operacional, o que lhe permitirá ampliar as ações de melhoria contínua da qualidade dos serviços”, afirmou.

Lobão disse ter ouvido de Kelman o compromisso de aumentar os investimentos da Light. Os números da distribuidora, que abastece mais de 70% do mercado fluminense, mostram que ela elevou seus investimentos, passando de R$ 352 milhões em 2007 (R$ 276 milhões em distribuição) para R$ 547 milhões em 2008 (R$ 456 milhões em distribuição) e chegando a R$ 564 milhões em 2009 (R$ 450 milhões em distribuição).

Ao justificar o aumento dos apagões, Kelman destacou o forte aumento do consumo na sua área de atuação — 25% em novembro de 2009, 13% em dezembro e 11% em janeiro, todos comparados com igual período do ano anterior. Kelman citou também a pressão das ligações clandestinas, afirmando que elas representam 20% do total da energia que circula na rede da Light.

André Moragas, diretor de relações institucionais da Ampla, disse que os investimentos da empresa são compatíveis e vêm mostrando “forte evolução”, com reflexos positivos na qualidade. Segundo ele, os indicadores foram particularmente afetados este ano pelo aumento dramático da incidência de raios e de chuvas nas áreas de concessão da empresa. “Com certeza, temos responsabilidade, não estávamos preparados era para um verão tão rigoroso.” Para 2010, a Ampla promete elevar seus investimentos para R$ 400 milhões (ante R$ 340 milhões em 2009), com foco especial na qualidade do serviço, que receberá metade dos investimentos totais.

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