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quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Em Itaberá, apagão ainda é mistério

  • 10 Nov 2010
  • Valor Economico
  • Marli Lima
  • De Itaberá

Mau tempo, com ventos e chuva, deixou o município de Itaberá, São Paulo, às escuras na sexta-feira. A queda de uma árvore na praça central danificou uma barraca de venda de brinquedos, a cobertura do ponto de táxi, um poste e a ligação elétrica. A volta da energia demorou três horas na maioria das casas, mas em um restaurante próximo ao acidente, as luzes só voltaram a se acender 24 horas depois.
Orestante do país nem ficou sabendo do que aconteceu na cidade, ao contrário de um ano atrás, quando um apagão afetou 18 Estados e nem sequer foi percebido pelos itaberenses. No caso da árvore, a explicação foi rápida: as raízes estavam fracas e não aguentaram. Mas até agora os moradores não sabem explicar o que aconteceu na noite de 10 de novembro de 2009.
Para muitos dos cerca de 17 mil moradores, pouco importa se o problema ocorreu na subestação de Furnas que leva o nome domunicípio e que recebe energia vinda da usina hidrelétrica de Itaipu. Não é o caso do prefeito da cidade, Walter Sérgio de Souza Almeida (DEM), que guarda correspondências que protocolou na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e na própria Furnas. “Não fiquei satisfeito com as respostas”, diz.
Na carta de 16 de novembro de 2009, ele quer saber da Aneel por que o município virou o “vilão da história” e questiona as explicações oficiais de que um vendaval teria provocado o blecaute. Em março, recebeu ofício da agência, no qual há a informação de que “Furnas foi notificada para apresentar justificativas” e que em razão da “complexidade do evento, tornou-se necessário maior aprofundamento das investigações”.
Almeida decidiu, então, questionar Furnas, e foi informado de que “foi implementado, em caráter emergencial, um conjunto de ações para a melhoria do desempenho” da subestação. No mesmo documento, no entanto, há a informação de que a manutenção estava em dia e que a queda no sistema “foi pontual e intempestiva e esteve associada a fenômenos climáticos severos”.
Na opinião do prefeito, Itaberá foi prejudicada pela situação. “Sempre que digo de onde sou, lembram do blecaute e do fato de que pessoas morreram naquela noite pela falta de energia, em hospital, vítima de assalto ou acidente de veículo.” Embora não tenha desistido de ir atrás de explicações, o desânimo não é escondido. “Acho que nunca vou ter resposta.”
Ao lado de Almeida, no gabinete da prefeitura, duas pessoas ouvem a conversa e uma lembra do que soube 12 meses atrás. “Veio um diretor de Furnas aqui e pediu para ninguém falar nada sobre o assunto”, conta. De fato, a empresa optou por ficar calada. Em Itaberá, o Valor não teve acesso à subestação e ninguém explicou o que foi feito no local nos últimos 12 meses. Um questionário com perguntas enviadas à direção não foi respondido. Com o silêncio, surgem especulações, uma delas vinda do prefeito. “Quiseram jogar a culpa no Estado de São Paulo, governado pelo PSDB, e preservaram o Paraná, que tem governo do PMDB”, diz Almeida. “Disseram que o problema ocorreu entre as subestações Ivaiporã (PR) e Itaberá (SP). Qual foi o local exato?”, questiona.
A suspeita de interferência política na transmissão de energia não existe apenas em Itaberá. Dias atrás, um diretor de Itaipu, usina que eximiu-se da culpa pelo apagão, falou do medo de que um novo blecaute pudesse prejudicar a então candidata do PT à presidência, Dilma Rousseff. Motivo da preocupação: distribuidoras paulistas poderiam estar do lado do candidato tucano, José Serra. Antes da eleição, mesmo com reservatório cheio, Itaipu estava produzindo bem abaixo de sua capacidade.
Taxista em Itaberá há 24 anos, José Pereira dos Santos prefere falar mais da queda da árvore na praça do que de outro assunto. “Do apagão ninguém comenta mais”, afirma, próximo ao que restou da planta. “Aqui houve um acidente. Para aquilo não há comprovação.”
Deitado em uma rede na frente de casa, distante cerca de 500 metros da subestação de Itaberá, o agricultor Benedito Eduardo Siqueira mostra-se pouco preocupado com o barulho emitido pelos fios carregados de energia que passam quase ao lado.
“A população ficou assustada no começo. Agora nem fala mais no assunto”, comenta. “Nós, que somos pobres, só nos preocupamos com a vida. “Enquanto Siqueira diz não ter visto chuvarada no local há um ano, seu vizinho, Manoel Perli Filho, lembra não apenas de relâmpagos. “Deu um estrondo grande e a energia piscou”, recorda.

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